quinta-feira, 24 de junho de 2010

Capítulo XII - Distanciamento Parte 1

Na manhã seguinte olhei para as grandes olheiras negras e profundas que se encontravam em cada olho no mesmo rosto ainda abatido pelo pouco tempo de sono que me permiti ter. Molhei o meu rosto com a água gelada que provavelmente teria ficado no cano ou na parte que não recebia a luz do sol pela manhã só para voltar a realidade. Era Sexta Feira e para alguns o que seria o melhor dia da semana, para mim seria um dia de batalha interna e externa com Ricardo. Bom, a minha batalha interna não dizia somente a respeito dele, mas de Fernando também. Ele que algumas horas antes havia me mandado um e-mail me contando como estava sua estada na França. As palavras escritas ali ficaram rodopiando em redemoinhos de lembranças na minha mente, lembranças de momentos bons, momentos que eu queria guardar para sempre; mas ao mesmo tempo me vinham as lembranças dos últimos dias em que passei ao lado dele. Conturbados, com um término precipitado e sem explicação. Aliás, desde que tudo isso aconteceu nada na minha vida tem uma certa explicação. Eu me sentia perdida muita das vezes em meus próprios pensamentos que se juntavam com atos, letras de músicas antigas que eu escrevia em papéis e deixava jogado em uma gaveta até eu ver e lembrar de que as coisas eram bem diferentes das coisas de agora. Eu resolveria tudo, ou pelo menos esperaria resolver os recentes acontecimentos com Ricardo. Queria perguntar a ele tudo o que ainda tinha dúvida e também tentar aproveitar o bom sentimento que ele passava para mim quando estava ao meu lado. Era como se eu tivesse uma epifania a cada 10 segundos, e não sei como consegui brigar com ele mesmo com esses detalhes. Me arrumei como de costume para mais um dia rotineiro, pelo menos era essa a impressão que eu queria causar para minha mãe, e então fazendo o mesmo ritual matinal de sempre, fechei a porta tranquei-a e pus embaixo do regador ao lado do jardim. Isso era bem coisa de filme americano, mas eu não ligava, gostava de deixar a chave lá, em um lugar onde só eu soubesse; as vezes eu me achava louca. Andei mais rápido do que o comum até chegar aos grandes portões cor de tijolo da minha escola. Passei pelos grupos (tribos de índios) e cheguei ao imenso e frio corredor da escola e encontrei Lux sentada na mureta da cantina rodiada de garotas que davam gritinhos estéricos e que quase me fizeram lembrar das fãs frenéticas dos Beatles que tanto me faziam rir. 
- Hey Lice! Tudo bom? - ela me puxou para a rodinha de garotas - Estamos falando sobre as novidades da escola! Sabia que a Lucia Mcroy, a tal inglesa que veio pra cá, ficou com aquele cara do futebol a tarde quem me contou foi...
A partir dai meus olhos se perderam o foco no resto do longo corredor e eu simplesmente escutava ela falar, mas na realidade não a ouvia. O sinal bateu e todo o grupo de garotas estéricas se dispersou e eu e Lux seguimos juntas para a aula de Artes que ia acontecer no galpão cênico. Conforme o restante da turma ia chegando eu ia ficando mais tensa. Meus nervos palpitavam, se é que isso é possível, dentro de mim e eu comecei a achar que ele não viria. Assim que a Profª com cara, jeito, pose e voz de bailarina, Helena entrou na sala eu quase perdi todas as esperanças. Se ele demorasse mais 5 minutos os inspetores não iriam deixa-lo entrar e ele teria de voltar para casa. Sendo que isso não podia acontecer; eu tinha que falar com ele. 
Começamos com a expansão do teatro no Brasil e foi-se seguindo a medida que os tópicos eram passados. Me virei para pedir um dos clips reservas da Lux para poder juntar toda a papelada de trabalho que estava amontoada no meu caderno impedindo que minha letra, que já não era muito boa, ficasse aceitável e assim pudesse continuar copiando. A profª interrompeu a explicação mas eu não dei atenção pois ainda estava esperando Lux achar o tal clips dentro da sua grande mochila, até que ouvi uma rápida e pequena repreensão da bailarina lecionadora:
- Dez minutos atrasados! Não sei como você conseguiu entrar. Deve ter dado uma desculpa muito boa - então ela riu fracamente- Qual é o seu nome?
 - Ricardo, professora. Ricardo Céflis. 
 Olhei para trás como se alguém tivesse puxado meu cabelo com muita força. E da mesma forma que minha cabeça iria doer se estivessem feito isso ela doeu. Meus olhos queimaram e eu olhei para ele. Então ele veio... Tudo seria resolvido e ficaria bem! Ainda fuzilando suas costas com os olhos vi que ele se acomodara de forma que desse para me ver, mesmo de longe. Voltei rapidamente meu olhar para o quadro branco e completamente preenchido agora com nomes de atores e atrizes de sucesso e até de uma banda de rock pela qual não sabia o motivo de estar ali. 
Assim que o sinal tocou corri para o lado dele e dei um tapa em seu ombro. Ele se virou para mim com uma expressão de compaixão, longe de uma de alegria, ou ao menos satisfação em me ver. Fiquei ainda mais tensa. 
- Oi Ricardo, tudo bom? - ele balançou a cabeça em resposta sem mudar e nem falar nada; arrisquei - Será que eu poderia falar com você. É rápido.
- Desculpa mas não dá. Tenho que resolver umas coisas na secretaria da escola que ainda estão pendentes. Quem sabe outra hora.
 E com essa 'deixa' ele saiu pela porta do galpão indo em direção do corredor de acessos me deixando sozinha com aquelas 'artes' penduradas nas paredes de forma mal colocada. Sai para a aula de Português cortando raivosamente as pessoas em meu caminho até chegar a sala no maior prédio da escola. Me escondi de Lux que agora estava em um novo grupinho de meninas para que ela não tivesse a curiosidade em saber sobre minha demora e minha cara. (CONTINUA...)

sábado, 5 de junho de 2010

CAPÍTULO XI - E-mail's.

A noite estava completamente turbulenta; como se eu tivesse entrado em um tornado a mais de 150 Km por hora e eu não pudesse parar a constante sensação de vertigem e descontentamento que se passava por cada ponto enérgico do meu corpo. Eu estava decepcionada comigo mesma por ter feito tudo o que fiz nos últimos dias e então comecei a me desafiar de forma a pensar no que fazer sobre o Ricardo. Abri a minha agenda novamente e alisei com meus dedos magros o papel branco que continha a caligrafia perfeita dele. Senti minha garganta queimar e apertar como se estivesse engolindo três tipos das piores pimentas do mundo. Ta, tudo bem. Eu sei que eu sou uma idiota, por ter ignorado ele completamente e agora eu posso simplesmente perde-lo. Trágico, trágico. Passei diversas horas da minha madrugada pensando em tudo o que havia acontecido desde que o Fernando terminou comigo e que eu conheci o Ricardo. Percebi que não eram poucas as coisas nas quais haviam acontecido e que por um motivo (ou mais) que eu não sabia, parecia que eu não estava dando a mínima para tudo aquilo. Mas haviam coisas no Ricardo que me intrigavam e nisso eu não havia parado de pensar nenhum dia desde que o conheci. A forma de ele estar sempre ali quando eu precisava dele. Até mesmo no dia em que eu o conheci, eu estava péssima e pronto, ele aparece como algo divino só para vir me ajudar. E quando eu fui a casa "dele" e quando voltei não era a casa dele. Essa é a coisa mais absurda no mundo humano! Isso é impossível e eu não sou louca. Estou bem sã, obrigada. O bilhete no meu bolso, esse bilhete dentro da minha gaveta! Asurdamente sinistro. O alerta de nova mensagem de e-mail soou no meu notebook que reinava absoluto sobre minha pequena mesa branca. Levantei e senti o frio cortar os meus pés recém aquecidos no meu grosso cobertor de dormir. Sentei na cadeira pressionando minhas pernas dobradas contra o peito e abri minha caixa de e-mail arrumada a pouco tempo, até porque eu não sou o tipo de pessoa na qual recebe vários e-mails, a não ser que sejam de spans. Assim que a inbox carregou, uma surpresa. O endereço do remetente era mais do que conhecido. Como eu haveria de esquecer o e-mail no qual era tanto usado para conversar comigo no messenger? Era ele, Fernando. Minhas mãos congelaram em fração de segundos e me sentir corar mesmo não tendo nenhuma razão para ficar sem graça ou algo do gênero. Cliquei na opção 'abrir' e esperei novamente a página carregar. A mensagem não era tão grande mas pela forma como ele escreveu pareceu ser mais do que uma simples 'lembrança'. Comecei a ler.


Alice,

Estou estudando em uma ótima escola aqui na França. Ainda não tenho tido muitos trabalhos, mas creio que isso irá mudar logo. Sinto sua falta. 
Estou arrependido de ter feito tudo aquilo antes de sair do país. Eu jamais vou me esquecer de você, e saiba que eu vou voltar para me encontrar com você. Ja t'aime.

Com amor, Fernando.

Meu coração parou e voltou a bater diversas vezes enquanto eu lia aquela simples linhas que tanto diziam. Ele sabia que eu ainda o amava. Amava mais do que tudo, e ele também sabia que ter me deixado foi um dos maiores erros dele. Acho que é por isso que o Ricardo tem aparecido nos  piores momentos, pois os tenho tido quase sempre. Eu sabia que Lux estava interessada nele, e estava com medo de Ricardo começar a se interessar por ela também e que toda essa 'proteção' dele por mim fosse transferida para ela de forma total e eu ficasse aqui completamente desamparada. Cliquei em 'Responder' na parte superior da janela de e-mail e comecei a escrever o que deveria ser uma boa e ensaiada mentira mas acabou saindo como uma verdade cuspida para fora da minha boca involuntariamente.

Fê, 
Eu também sinto muito a sua falta. Fico feliz por ter conseguido a bolsa que queria. Isso de certa forma tem grande importância para mim. Saiba que eu não esqueço você em nenhum dia que se passe desde que você se foi. Estou ainda mais feliz por você ter encontrado um tempo para poder me mandar alguma notícia, assim não me sinto totalmente fora da sua vida. 

Da sua sempre amiga e companheira, Alice.

E sem 'mais' levantei da cadeira deixando aberta a página de conclusão de envio e cai de costas na cama olhando para a janela agora salpicada de estrelas longínquas que me lembravam da distância que agora me separavam de Fernando. Resolver as coisas entre nós agora seriam muito mais difíceis, talvez impossível. E isso me frustrava. Eu não fiz nada para resolver aquilo antes dele ir, e isso poderia ter sido só pelo fato de eu me sentir 'segura' em relação a uma pessoa que eu nem sabia mais se estaria do meu lado. E então eu decidi. Na manhã seguinte eu iria procurar o Ricardo e pediria desculpas pelo que aconteceu e também pediria uma boa explicação sobre essas coisas sinistras que existes em relação a ele. E assim tudo ficaria bem de novo. Pelo menos era o que eu esperava...

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Capítulo X - Anjos

Minha mãe chegou fechando a porta silenciosamente como de costume. Deixou cair seu pesado casaco nas costas de uma cadeira da cozinha e se apressou para fazer o de sempre: me dar um beijo no cabelo. Olhei para trás e forcei um sorriso retribuindo o beijo agora no rosto.


- Como foi seu dia querida?
- Normal mãe. Lux veio aqui essa tarde.
- Que ótimo! - ela disse como um grito de euforia irreprimível - Fazia tanto tempo que ela não vinha aqui.
- É verdade mãe. Foi legal. E o seu dia como foi?
- Ah, minha filha. O de sempre, trabalho, clientes chatos, papelada, mais trabalho. - e então ela bufou de exaustão.
- Então, Dona Abigail, eu tenho um ótimo remédio para você. Um belo banho quente no banheiro com banheira do segundo andar! - ela riu
- Parece ótimo filha. Vou aprontar as coisas. O que vai ter hoje para jantar? 
- Macarrão ao molho branco - ri sugestivamente pois sabia que ela adorava esse prato.
- Uau! Está melhorando aqui nesse espaço hen! - e como as divas de Hollywood fez sua saída triunfal!


Terminei de preparar todo o jantar e a mesa para eu e minha mãe jantarmos. Depois disso subi para meu quarto e então assim que entrei senti um delicioso cheiro de lavanda pairando no ar. Mas não havia nada de lavanda no meu quarto, como o cheiro estaria lá? Entrei e comecei a revirar minhas gavetas à procura de um pijama para vestir. Ao abrir a terceira gaveta puxei meu grande e desproporcional pijama verde que me deixava com aparência de sapo mas que eu amava. Porém, embaixo, agora no lugar onde estava o pijama, estava uma folha de papel; um papel que lembrava muito o que devia sido deixado no meu bolso alguns dias atrás pelo Ricardo. Peguei o papel e abri, eu não tenho hábito de guardar papéis em gavetas ou algo do gênero; minha agenda já tinha isso como obrigação. No papel encontrava-se um texto com uma letra na qual não se passaria por estranha aos meus olhos. Estava escrito:








As ondas são anjos que dormem no mar,
Que tremem, palpitam, banhados de luz…
São anjos que dormem, a rir e sonhar
E em leito d’escuma revolvem-se nus!
E quando de noite vem pálida a lua
Seus raios incertos tremer, pratear,
E a trança luzente da nuvem flutua,
As ondas são anjos que dormem no mar!
Por que não consentes, num beijo de amor
Que eu diga-te os sonhos dos anjos do mar?




Anjos do Céu - Álvares Azevedo




Sei que gosta desse poema. Não quero que me esqueça. Mas agora vou ser o anjo que dorme no mar.
Ricardo.

Senti meu corpo inflamar em chamas que me consumiam lentamente mas que não me queimavam. Meus membros se arrepiaram e senti o mesmo vento na nuca de quando eu pensava nele. Meus dedos se fecharam para o papel como se eu pudesse tocá-lo. Meus olhos se fecharam e pude sentir seus lábios. Como ele sabia do meu poema favorito eu não fazia a mínima idéia. O que queria saber era o motivo pelo qual ele disse que seria o anjo que dorme no mar. Seria isso uma forma dele dizer que vai se afastar de mim? Eu sabia que havia evitado ele; e talvez por isso ele queira ir embora para nunca mais voltar. Eu não podia permitir. Ele poderia ir embora e me deixar aqui sem saber o real motivo. 

- Alice! Alice, filha, cadê você?
Minha mãe irrompeu pela porta do meu quarto a minha procura e então fechei o papel rápidamente colocando-o dentro do bolso frontal do meu casaco.
- Oi mãe. O que foi?
- Ora, 'O que foi'. Estou te procurando para jantar. Pensei que já estivesse terminado o banho. 
- Não mãe, eu só... Me distrair vendo umas coisas aqui no quarto. Pode descer e ir colocando o seu prato. Já vou descer para te acompanhar.
- Tudo bem. Não demore.

E então ela saiu, me deixando sozinha com minhas gigantes dúvidas que pareciam me esmagar em todos os lugares. Tirei o papel do bolso e o coloquei dentro da minha agenda logo na primeira página. Ainda teria a madrugada inteira para ficar olhando para aquilo e me questionar diversas vezes sobre os mesmos questionamentos.

Tomei um banho quente, pois só isso me fazia acalmar, e então coloquei meu pijama verde-brejo. Desci e encontrei uma mãe completamente lambuzada de molho branco. Não pude me conter e rir. Minha mãe era meu exemplo e minha cúmplice sempre. Vê-la feliz, e se divertindo até com a comida na qual ela mais gosta me fazia feliz e até me deixava esquecer momentaneamente os meus 'problemas' que perto dos delas pareciam uma conta ridícula de matemática que aprendi a anos atrás no começo da minha alfabetização. Comi com ela um enorme prato de macarrão. Depois lavei a louça e me deitei confortavelmente no sofá para ver o fim de um filme de comédia romântica que passava pela milésima vez na tevê e que mesmo assim me fazia rir. Assim que minha mãe subiu para seu quarto eu também me recolhi indo somente antes ao banheiro para escovar os dentes. Então me lembrei do papel que estava na minha gaveta. Eu não tinha esquecido aquilo, mas enquanto estava na sala o deixei em segundo plano, escondido e abafado pelos meus outros pensamentos, mas agora ele parecia ter voltado com uma força inacreditável fazendo minha cabeça doer. Entrei no meu quarto como quem entra em uma batalha; pronta para todas as emoções que iriam vir, e então me armei com minhas barras de cereais e meu enorme cobertor colocando em cima de mim apenas minha agenda com aquele papel dentro. Tudo estava na minha frente como um flashback no qual já sabia todas as falas. Mergulhei no mais profundo dos meus sentimentos e quando pensei suforcar senti que podia respirar embaixo de todo aquele mar de pensamentos e então decidi ficar ali. Pelo menos por algumas horas.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

CAPÍTULO IX - Blues




Já em casa passei pelo cômodos impecávelmente limpos pela minha mãe e fui ao quarto dela. A cama estava desfeita e mais uma vez me vi sozinha naquela situação. Me deitei em cima dos cobertores com um pouco de neve no casaco mas não me importei. Não fazia tanto frio dentro de casa e por um minuto me senti segura. Meu almoço já estava pronto só faltava ser esquentado, minha mãe como sempre tinha deixado meu suco de maçã preferido na geladeira e uma grande taça de sorvete no freezer. O engraçado é por mais frio que fizesse naquela época, meu sorvete estava lá, sempre... As vezes minha mãe parecia louca, mas eu gostava desse jeito dela, só dela.
Repassei cada episódio do meu dia novamente, tentando cortar algumas partes e editá-las por si só na minha mente. Não obtive sucesso. Eu podia sentir a dor dele agora, eu poderia vê-lo chorar sem ele estar na minha frente. Eu queria abraça-lo, para poder confortar aquela dor. Mas para nós seria apenas mais um subterfúgio, nós iríamos tentar confortar o inconfortável, pois agora ele se afastaria de mim e conseqüentemente eu me afastaria dele. Eu não queria isso, eu queria estar com ele mas dentro de mim havia a raiva me consumindo, uma raiva que eu não sabia de onde estava vindo, e nem para onde iria. 

sumido aquele dia inteiro pela manhã. Escutei tudo o que ela disse, mas sem realmente ouvir, e então por fim assenti o fato dela em meia hora vir na minha casa para ver demais detalhes e assim poder conta-la o que havia acontecido. Desliguei o telefone como quem desliga a luz de uma cozinha rotineiramente. Parecia estar sem sentimentos. Então, apoiando meus abraços no canto da janela que dava para o jardim em frente a minha casa decidi esquece-lo. Eu sabia que doeria, e que por mais que eu fizesse isso eu não conseguiria esquecer nada absolutamente nada do que havia acontecido entre nós. Eu iria me esforçar, eu iria chorar algumas noites, talvez dias também... Mas eu não podia ficar assim. Como alguém que você conhece em tão pouco tempo pode mexer tanto com você? Eu não sabia, mas queria saber.


O telefone tocou. Lux falava do nosso trabalho de filosofia no qual deixei em segundo plano por esses dias e também me perguntava preocupadamente qual fora o motivo pelo qual eu havia 

Tomei um banho rápido em água escaldante que descia pelo cano do chuveiro agora fumegando. Arrumei meu cabelo e coloquei uma calça de moletom com um blusa da Inglaterra que tinha surrada no fundo do armário. Só a Lux apareceria e eu não devia temer a mais nenhum olhar curioso em mim . Enfim a capainha tocou e eu ouvi a porta de baixo bater; Lux tinha liberdade total de entrar na minha casa assim que tocasse a campainha. Desci as escadas e a encontrei jogada no sofá da sala de estar como de costume. 

- Oi Lice. Cara, por quê você sumiu hoje o dia inteiro!?
- Passei mal, fui para a enfermaria - menti. eu não tinha outra saída, falar do Ricardo desse jeito seria um tanto quanto estranho.
- Mentira! Eu mesma fui ver na enfermaria e todos disseram que não viram você. E saiba que eu reparei que depois do intervalo você e aquele seu amigo novo sumiram. 
- Ei, o Ricardo não voltou para aula? Não, ele simplesmente desapareceu!
- De novo! - falei em voz baixa para mim mesma.
- O que disse?
- Hã... nada. Nada não Lux.
- Sua louca - e me tacou a almofada - Vamos falar sobre o trabalho e esse seu amiguinho misterioso? Hen hen?
Dei umas três risadinhas nervosas consecutivas.
- Ok sua chata! Já pesquisou sobre aqueles caras carecas e de barba branca que filosofavam? 
- Já sim. Mas ficou alguns faltando. Dá pra você pesquizar Aristóteles e Platão? 
- Claro. Isso eu faço em dez minutos!
- Olha só que convencida. 
E então estavamos rindo de novo. Peguei no freezer mais uma vez o enorme pote de sorvete e tirei três bolas do meu sorvete preferido: Flocos! Para cada uma de nós. Comemos e rimos mais um pouco das piadas da Lux sobre o meu amigo que sumia depois do intervalo.
- Ah Lice, me conta vai... Você ficou com ele não ficou? 
- Eu... Ei Lux, deixa isso onde deve estar, longe daqui!
- Ih, se não ficou, brigou! Conta amiga!
- Não Lu, no momento certo você vai saber.
- Vou fazer um comentário mas eu espero que você não me bata ok?
- Ta bom.
- Ele é MUITO bonito!
Taquei a almofada mais perto de mim bem no meio do rosto dela
- Ei! Você disse que não bateria! 
- Você disse que esperava que eu não fizesse e eu não prometi nada!
- Mas que ele é bonito ele é! Parece um anjo! 
- Fica quieta ai Lux! - então dei um tapa amigável no seu ombro recolhendo as taças, agora vazias, de sorvete indo até a cozinha deixando-as em cima da pia.

A tarde começava a cair entre as montanhas e eu precisava arrumar o jantar para mim e para minha mãe. Lux recolheu seu pesado casaco de frio e foi embora cruzando somente a rua para chegar em sua casa. Liguei a tv no canal de música e coloquei na opção de Blues. Quase ninguém sabia que eu gostava disso e eu ouvia simplesmente para poder relaxar. Acendi o fogo no fogão branco mármore e a água que fervia; fervia como as veias que pulsavam o meu coração.

terça-feira, 4 de maio de 2010

Capítulo VIII - Inverno

Como em um súbito uma corrente elétrica passou pelo meu corpo de forma incompreensível. Eu o afastei e toda aquela alegria de vê-lo e por conversar haviam acabado! Lembrei de que ele tinha sumido sem explicações e que me fez de boba por aquele tempo! Fitei-o cerrando os olhos de raiva e ele sem entender nada tentou se aproximar... Porém eu o afastei novamente. Eu queria matá-lo com somente um pensamento, queria sair correndo daquele lugar, o deixar para trás! Ele segurou meu braço e eu desviei; olhei para o chão em procura de algo para fazer, sem ter muito o que pensar. 

- Me deixa em paz! - tentei passar por ele para sair mas ele encobriu a passagem.
- O que é isso Lice? - ele olhava estupefado para mim.
- É A-LI-CE! Alice entendeu? Me deixe. Não vai ser dificil! Já que fez isso! 
- Você não entende...
- Não entendo e nem quero entender! Me deixe ir!


Empurrei-o para o lado e sai correndo pelo campus da escola. Meus olhos arderam e meu lacrimal se marejou! Aonde eu estava com a cabeça? Eu não sei. Mas por mais que doesse minha raiva consumia tudo o que havia dentro de mim. Eu não queria mais vê-lo; eu não queria mais NADA!
O sinal batia e o som entrava pelos meus ouvidos como uma faca afiada! Corri para o banheiro dos fundos do prédio azul. Ele estava desativado a meses e ficava vazio todo o tempo. Entrei naquela imensidão de azulejos brancos e cheio de mármore e me sentei no chão poeirento no qual ninguém mais andava e cai em choro profundo. Passei o resto de todas as aulas ali, mas por mais sozinha que eu estivesse eu sentia que estava sendo observada! Meus olhos estavam inchados demais para ver ao meu redor e ainda mais inchados estavam meus dedos por serem apertados contra os meus joelhos, agora encharcados de lágrimas. Então quando o último sinal bateu eu me levantei e fui direto ao espelho ver como estava e para tentar ficar com uma cara um pouco mais aceitável pela sociedade e assim poder ir embora. Não pude lavar o rosto pois como o banheiro estava fechado para as pessoas o registro tinha sido trancado também impedindo a saída de água nas torneiras. Sai tentando disfarçar o indisfarçável! Saquei minha melhor arma de dentro da mochila. Meu querido chapéu de inverno que cobria quase todo o eu rosto. Coloquei-o e sai pelos fundos da escola para a rua "C" que dava saída para a rua principal da cidade. Corri para a casa a fim de chegar e me derramar mais em lágrimas mesmo agora achando estar seca de mais para isso!
Eu não iria mais falar com ele. Eu prometi isso a mim mesma. Ricardo agora seria o meu presente-passado. Ou pelo menos eu tentaria que fosse isso! Meu inverno chegou mais frio do que qualquer coisa na estação. Me senti gélida e impenetrável como a neve que caía fria sobre meu rosto naquele momento. Eu estava morrendo, e sabia disso!

domingo, 2 de maio de 2010

CAPÍTULO VII - Surpresa


 
Recostei minha cabeça na aste de madeira da minha cama. Olhando a linda pena, branca e uniforme com aquele 'bilhete' na ponta. Eu não sabia o que significava nada daquilo! Não sabia o porque dessas penas, de onde viam e que propósito tinham, mas eu sabia, dentro de mim que havia uma relação com Ricardo. 
Mas ele me deixou aqui. Simplesmente sumiu, e eu não estou louca, eu estive dentro daquela casa, eu entrei ali, eu beijei ele dentro da sala quente e aconchegante com cheiro de café. Eu estava lá, ele também estava, então porque ele sumiu? Passei quase toda a noite imaginando o motivo pelo qual ele havia sumido, sem sequer dizer adeus. Ele não poderia ter se mudado do dia para noite, muito menos o fato dele nunca ter morado naquela casa sendo que eu que estava em sã consciência estive lá. Já eram quase 3:00hrs da manhã e eu estava acordada, ainda olhando para a janela talvez na esperança de encontrar uma resposta para todas as minhas perguntas ou simplesmente vê-lo passar e descer as escadas da minha casa correndo indo encontrá-lo só para perguntar o que aconteceu. Também pensei em Fernando, que naquele momento estaria a um oceano de distância, tão longe que nem meus pensamentos conseguiriam chegar até ele. Mais do que nunca eu estava só e talvez fosse ficar assim por muito tempo.


As cortinas roxas que cobriam a claridade que entrava pela janela se abriram me acordando de forma súbita e irracional. Meu estômago deu pontadas agudas dentro de mim pelo susto e pela fome que eu sentia; afinal eu não tinha comido nem um grão de arroz no dia anterior. Minha mãe saiu do quarto indo se arrumar para trabalhar. Levantei da cama com meus cabelos embaraçados e bagunçados colocando-me de pé em frente ao espelho que me dizia agora muito claramente que eu precisava de um banho e uma escova de cabelos. Passei mais tempo do que o normal dentro do chuveiro deixando a água cair quente pelos meus ombros em tentativa de me fazer relaxar. Escovei os cabelos e os dentes ficando com uma aparência em absurdos melhor; coloquei uma calça jeans e uma blusa qualquer junto com meu velho e companheiro All Star. Quando desci para tomar o café a mesa já estava posta com uma enorme xícara de leite quente com chocolate e torradas amanteigadas, agradeci minha mãe mentalmente e comi tudo rápido, quase sem respirar. Antes de terminar minha mãe então passou por mim dando-me um beijo no topo da cabeça e me desejando um bom dia, desejei a ela que fosse muito melhor do que o meu, porque de fato eu não cria que algo de bom fosse acontecer naquele dia.


- Querida, não esqueça as chaves - ela gritou enquanto saia e fechava a porta atrás dela.
- Ta bom mãe! - gritei de volta mesmo sabendo que ela não iria ouvir.


Levantei da mesa arrumando tudo antes de sair para a aula. Minha escola não era muito longe dali então decidi ir andando mesmo, só para ter mais um tempo sozinha para pensar, mas quando sai de casa minha teoria de 'minutos sozinha comigo mesma' foi embora com o primeiro carro que passava. Lux saia de casa também e acenou para mim freneticamente. Ela se aproximou dando-me dois beijos chochos no rosto porém ainda com um sorriso.


- Oi Lice, pronta para mais um dia naquele matadouro? - ela riu da sua piada infame.
- Talvez. Como está?
- Estou bem e você?
- Levando... - meu olhar recaiu sobre meus pés ao dizer isso.
- Levando é? Aconteceu alguma coisa?
- Fernando se mudou.
- Nossa, para onde? Pra rua de baixo?
- Não, para a França. 


Lux paralisou longos segundos em meio a rua tive que arrasta-la para não chegarmos atrasada na escola. 


- Como assim para a França Lice? E você e ele?
- A gente já tinha terminado Lux, você sabe disso! 
- Eu sei, mas eu podia jurar que tinha volta! Cara, você deve estar muito mal.
- E estou - menti como se só fosse isso que me atormentasse - mas espero melhorar em breve!
- Você vai melhorar amiga, você vai ver. Vou ajudar nisso! - ela deu um sorriso solidário dessa vez.


Caminhamos por mais algumas ruas até chegarmos ao colégio, o sinal já havia tocado então corremos para nossa primeira aula: Sociologia. O profº Magnus passou uma redação sobre amor na sociedade. ÓTIMO assunto para se abordar quando uma pessoa está sozinha e 'sofrendo'. Terminei no segundo tempo uma mega redação revoltada porém sóbria da minha visão sobre o assunto. Assim que o sinal tocou novamente agora para aula de Matemática guardei todo o meu material e segui para o pátio, por algum motivo que nem eu e nem nenhum aluno sabia qual a aula seria ao 'ar livre'. Bom, pelo assim eu conseguiria arejar a cabeça enquanto fazia os enormes cálculos completamente desnecessário passados em aula.
As aulas do ano mal haviam começado e eu já estava precisando me esforçar pelo ano todo já de cara, isso me deixava cansada e querendo férias logo de inicio! O primeiro tempo passou e então algo quente tocou um dos meus ombros. Eu já sabia o que era antes mesmo de pensar e me perguntar o que. Mas era impossível, eu estava em aula e só alunos podem entrar no prédio das salas, então olhei para trás e o vi. Mais lindo do que nunca e com uma expressão implorando perdão automaticamente. 


- Oi. 
- O que faz aqui? - minha pergunta praticamente pulou da minha boca sem meu consentimento. 
- O mesmo que você! Estudando! - então ele sorriu
- Mas você não estudava aqui, estudava? 
- Não, me matriculei semana passada. 
- Hum. Bom, eu queria conversar...
- Ei, vocês dois ai atrás, façam o trabalho e parem de falar! 


Gritou a professora de sua mesa com aquele seu típico olhar psicopata. Guardei todos os meus questionamentos para mim mesma novamente e esperei até que pudesse conversar com ele.
Assim que fomos para o intervalo o puxei para um canto da parte de grama do pátio mas quando percebi estávamos nos beijando, de novo.


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Soundtrack CAP VII
Taylor Swift - Breathe
Daniel Powter - Bad Day
Paramore - The Only Exception (Música tema de Alice&Ricardo)




Be yourself, be original
DON'T COPY (:

quarta-feira, 28 de abril de 2010

Capítulo VI - Desaparecimento



Caminhei pelas ruas e vielas que me faziam cortar caminho para chegar mais rápido ao parque. Senti meus pés fumegarem quando comecei a avistar a grama rasteira e verde que cobria todo aquele lugar. Não tinha mudado nada desde o dia em que conheci Ricardo, mesmo bancos, mesma barraca de Hot-Dogs porém ele não estava ali como aquele dia. Me sentei no banco no qual me fazia ter visão de todo parque e procurei inconstante tentando ver aquele rosto conhecido e angelical escondido atrás de uma árvore ou alguma revista em quadrinhos. Estiquei meu pescoço até senti-lo doer e então desisti, largando-me no banco de madeira deixei meus pensamentos flutuarem por alguns lugares distantes. Me permiti sair do foco daqueles dias, deixei Fernando e Ricardo de lado e fechei os olhos para ouvir o canto dos pássaros e sentir a brisa fresca tocar meu rosto como se estivesse recebendo um carinho do próprio ambiente no qual estava.
Vários minutos se passaram e então minha mente voltou ao assunto central. Ricardo ainda não havia chego mesmo sendo ele quem marcou o encontro. Algo poderia ter acontecido a ele. Decidi então comprar um suco para passar o tempo e esperar mais um pouco. 
Observei atentamente duas crianças brincarem nos brinquedos coloridos. Elas pareciam tão felizes e sem preocupações, como se tudo aquilo em volta delas não passasse de uma simples brincadeira em que todos jogavam como pedrinhas sobrepostas em um tabuleiro no qual somente elas podiam movimentar. Era lindo ver que pelo menos algumas pessoas no mundo, por mais pequenas e infantis que fossem pudessem felizes e sem preocupações. Senti uma longa sensação de paz tomar conta de mim. Levantei do banco no qual estava sentada tomando o grande suco de abacaxi com hortelã e sem seguida pus a mão no bolso tirando novamente aquele pequeno papel com o endereço que o próprio Ricardo tinha anotado poucos dias atrás. Sai caminhando novamente pelas ruas observando pouco os detalhes agora, somente olhando de relance para algumas coisas nas quais me chamavam a atenção. Finalmente cheguei a pequena porém imponente avenida na qual encontrava-se a casa com o mais delicioso cheiro de café do mundo. Parei em frente ao Nº 13 e toquei a campainha um pouco mais confiante do que da última vez na qual tinha feito o mesmo. A porta se abriu e saiu então uma mulher, um pouco velha por sinal, já com cabelos brancos e um pijama rosa-chá feito de pano flanela, mas ela ao contrário de músicas 'velhas' andava perfeitamente bem e com um certo charme.


- Boa tarde senhora. Ricardo está?
A moça torceu o nariz numa expressão que indicava não estar entendendo o que eu dizia. Talvez ela tivesse problemas de surdez e não ouvira direito o que tinha dito, então repeti.
- Boa tarde, o Ricardo se encontra?
- Eu ouvi você na primeira vez que disse minha jovem - disse ela com uma voz bastante forte para sua idade - Mas não mora ninguém que se chame Ricardo nessa casa.


Paralisei e em seguida olhei para o papel com o endereço conferindo para ver se era o mesmo número da casa. E estava certo. Eu estava na Avenida Sherman Nunes em frente ao Nº 13. Eu estive ali uma noite atrás era impossível estar errado.


- É... Desculpe, mas, eu estive aqui ontem, aliás eu entrei ai ontem com um menino chamado Ricardo - apontei para a porta de madeira além do grande portão preto - E tinha uma mulher, a mãe dele, ela se chamava Agnes. 
- Minha querida, eu me chamo Constance e nunca nenhuma mulher chamada Agnes, nem um homem chamado Ricardo moraram aqui. Talvez tenha errado.
- Mas senhora - peguei o papel e coloquei na mão enrugada da senhora - leia, o endereço está certo. E veja, há o nome do menino no final.
- Não há nada aqui. Somente o nome da avenida. Mais nada!
- Impossível - Peguei o papel novamente e olhei para ele. De fato não havia nada ali, somente o nome da avenida e mais nada. Fitei o papel por mais alguns segundos e então falei por fim. - Me desculpe senhora, acho que realmente me equivoquei.


Dando as costas para a senhora com pijama sai correndo para os portões centrais da avenida e sai na rua principal. Eu só queria chegar em casa. A cada passo dado era uma olhada dada também no papel. Era impossível, a poucos minutos estava tudo ali. O endereço completo, o recado, a assinatura de Ricardo no fim. Estaria eu louca? Será que a noite anterior fora só um sonho e nunca aquilo teria acontecido de verdade? Essa possibilidade era ainda mais improvável ainda.
Chegando em meu quarto retirei os sapatos nos quais joguei para um canto junto com minha pequena bolsa de contas na qual só havia o troco da suco comprado no parque.
Me deitei em minha cama enterrando minha cabeça nos travesseiros que cobriam toda a extensão. Chorei por diversos minutos, e então senti um vento quente cortar minhas costas. Levantei dos travesseiros e olhei a janela, mas esta estava fechada e então, em cima da minha mesa havia uma pena, branca como a neve no inverno europeu, perfeita e na ponta um pequeno pedaço de papel amassado com somente uma palavra. 
"Desculpe"

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