quinta-feira, 24 de junho de 2010

Capítulo XII - Distanciamento Parte 1

Na manhã seguinte olhei para as grandes olheiras negras e profundas que se encontravam em cada olho no mesmo rosto ainda abatido pelo pouco tempo de sono que me permiti ter. Molhei o meu rosto com a água gelada que provavelmente teria ficado no cano ou na parte que não recebia a luz do sol pela manhã só para voltar a realidade. Era Sexta Feira e para alguns o que seria o melhor dia da semana, para mim seria um dia de batalha interna e externa com Ricardo. Bom, a minha batalha interna não dizia somente a respeito dele, mas de Fernando também. Ele que algumas horas antes havia me mandado um e-mail me contando como estava sua estada na França. As palavras escritas ali ficaram rodopiando em redemoinhos de lembranças na minha mente, lembranças de momentos bons, momentos que eu queria guardar para sempre; mas ao mesmo tempo me vinham as lembranças dos últimos dias em que passei ao lado dele. Conturbados, com um término precipitado e sem explicação. Aliás, desde que tudo isso aconteceu nada na minha vida tem uma certa explicação. Eu me sentia perdida muita das vezes em meus próprios pensamentos que se juntavam com atos, letras de músicas antigas que eu escrevia em papéis e deixava jogado em uma gaveta até eu ver e lembrar de que as coisas eram bem diferentes das coisas de agora. Eu resolveria tudo, ou pelo menos esperaria resolver os recentes acontecimentos com Ricardo. Queria perguntar a ele tudo o que ainda tinha dúvida e também tentar aproveitar o bom sentimento que ele passava para mim quando estava ao meu lado. Era como se eu tivesse uma epifania a cada 10 segundos, e não sei como consegui brigar com ele mesmo com esses detalhes. Me arrumei como de costume para mais um dia rotineiro, pelo menos era essa a impressão que eu queria causar para minha mãe, e então fazendo o mesmo ritual matinal de sempre, fechei a porta tranquei-a e pus embaixo do regador ao lado do jardim. Isso era bem coisa de filme americano, mas eu não ligava, gostava de deixar a chave lá, em um lugar onde só eu soubesse; as vezes eu me achava louca. Andei mais rápido do que o comum até chegar aos grandes portões cor de tijolo da minha escola. Passei pelos grupos (tribos de índios) e cheguei ao imenso e frio corredor da escola e encontrei Lux sentada na mureta da cantina rodiada de garotas que davam gritinhos estéricos e que quase me fizeram lembrar das fãs frenéticas dos Beatles que tanto me faziam rir. 
- Hey Lice! Tudo bom? - ela me puxou para a rodinha de garotas - Estamos falando sobre as novidades da escola! Sabia que a Lucia Mcroy, a tal inglesa que veio pra cá, ficou com aquele cara do futebol a tarde quem me contou foi...
A partir dai meus olhos se perderam o foco no resto do longo corredor e eu simplesmente escutava ela falar, mas na realidade não a ouvia. O sinal bateu e todo o grupo de garotas estéricas se dispersou e eu e Lux seguimos juntas para a aula de Artes que ia acontecer no galpão cênico. Conforme o restante da turma ia chegando eu ia ficando mais tensa. Meus nervos palpitavam, se é que isso é possível, dentro de mim e eu comecei a achar que ele não viria. Assim que a Profª com cara, jeito, pose e voz de bailarina, Helena entrou na sala eu quase perdi todas as esperanças. Se ele demorasse mais 5 minutos os inspetores não iriam deixa-lo entrar e ele teria de voltar para casa. Sendo que isso não podia acontecer; eu tinha que falar com ele. 
Começamos com a expansão do teatro no Brasil e foi-se seguindo a medida que os tópicos eram passados. Me virei para pedir um dos clips reservas da Lux para poder juntar toda a papelada de trabalho que estava amontoada no meu caderno impedindo que minha letra, que já não era muito boa, ficasse aceitável e assim pudesse continuar copiando. A profª interrompeu a explicação mas eu não dei atenção pois ainda estava esperando Lux achar o tal clips dentro da sua grande mochila, até que ouvi uma rápida e pequena repreensão da bailarina lecionadora:
- Dez minutos atrasados! Não sei como você conseguiu entrar. Deve ter dado uma desculpa muito boa - então ela riu fracamente- Qual é o seu nome?
 - Ricardo, professora. Ricardo Céflis. 
 Olhei para trás como se alguém tivesse puxado meu cabelo com muita força. E da mesma forma que minha cabeça iria doer se estivessem feito isso ela doeu. Meus olhos queimaram e eu olhei para ele. Então ele veio... Tudo seria resolvido e ficaria bem! Ainda fuzilando suas costas com os olhos vi que ele se acomodara de forma que desse para me ver, mesmo de longe. Voltei rapidamente meu olhar para o quadro branco e completamente preenchido agora com nomes de atores e atrizes de sucesso e até de uma banda de rock pela qual não sabia o motivo de estar ali. 
Assim que o sinal tocou corri para o lado dele e dei um tapa em seu ombro. Ele se virou para mim com uma expressão de compaixão, longe de uma de alegria, ou ao menos satisfação em me ver. Fiquei ainda mais tensa. 
- Oi Ricardo, tudo bom? - ele balançou a cabeça em resposta sem mudar e nem falar nada; arrisquei - Será que eu poderia falar com você. É rápido.
- Desculpa mas não dá. Tenho que resolver umas coisas na secretaria da escola que ainda estão pendentes. Quem sabe outra hora.
 E com essa 'deixa' ele saiu pela porta do galpão indo em direção do corredor de acessos me deixando sozinha com aquelas 'artes' penduradas nas paredes de forma mal colocada. Sai para a aula de Português cortando raivosamente as pessoas em meu caminho até chegar a sala no maior prédio da escola. Me escondi de Lux que agora estava em um novo grupinho de meninas para que ela não tivesse a curiosidade em saber sobre minha demora e minha cara. (CONTINUA...)

Um comentário:

  1. Olha, eu só li esse capítulo e já adorei a história toda!
    Tu escreves bem, menina.
    Parabéns.
    Beijos,

    Vitória.

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