segunda-feira, 10 de maio de 2010

CAPÍTULO IX - Blues




Já em casa passei pelo cômodos impecávelmente limpos pela minha mãe e fui ao quarto dela. A cama estava desfeita e mais uma vez me vi sozinha naquela situação. Me deitei em cima dos cobertores com um pouco de neve no casaco mas não me importei. Não fazia tanto frio dentro de casa e por um minuto me senti segura. Meu almoço já estava pronto só faltava ser esquentado, minha mãe como sempre tinha deixado meu suco de maçã preferido na geladeira e uma grande taça de sorvete no freezer. O engraçado é por mais frio que fizesse naquela época, meu sorvete estava lá, sempre... As vezes minha mãe parecia louca, mas eu gostava desse jeito dela, só dela.
Repassei cada episódio do meu dia novamente, tentando cortar algumas partes e editá-las por si só na minha mente. Não obtive sucesso. Eu podia sentir a dor dele agora, eu poderia vê-lo chorar sem ele estar na minha frente. Eu queria abraça-lo, para poder confortar aquela dor. Mas para nós seria apenas mais um subterfúgio, nós iríamos tentar confortar o inconfortável, pois agora ele se afastaria de mim e conseqüentemente eu me afastaria dele. Eu não queria isso, eu queria estar com ele mas dentro de mim havia a raiva me consumindo, uma raiva que eu não sabia de onde estava vindo, e nem para onde iria. 

sumido aquele dia inteiro pela manhã. Escutei tudo o que ela disse, mas sem realmente ouvir, e então por fim assenti o fato dela em meia hora vir na minha casa para ver demais detalhes e assim poder conta-la o que havia acontecido. Desliguei o telefone como quem desliga a luz de uma cozinha rotineiramente. Parecia estar sem sentimentos. Então, apoiando meus abraços no canto da janela que dava para o jardim em frente a minha casa decidi esquece-lo. Eu sabia que doeria, e que por mais que eu fizesse isso eu não conseguiria esquecer nada absolutamente nada do que havia acontecido entre nós. Eu iria me esforçar, eu iria chorar algumas noites, talvez dias também... Mas eu não podia ficar assim. Como alguém que você conhece em tão pouco tempo pode mexer tanto com você? Eu não sabia, mas queria saber.


O telefone tocou. Lux falava do nosso trabalho de filosofia no qual deixei em segundo plano por esses dias e também me perguntava preocupadamente qual fora o motivo pelo qual eu havia 

Tomei um banho rápido em água escaldante que descia pelo cano do chuveiro agora fumegando. Arrumei meu cabelo e coloquei uma calça de moletom com um blusa da Inglaterra que tinha surrada no fundo do armário. Só a Lux apareceria e eu não devia temer a mais nenhum olhar curioso em mim . Enfim a capainha tocou e eu ouvi a porta de baixo bater; Lux tinha liberdade total de entrar na minha casa assim que tocasse a campainha. Desci as escadas e a encontrei jogada no sofá da sala de estar como de costume. 

- Oi Lice. Cara, por quê você sumiu hoje o dia inteiro!?
- Passei mal, fui para a enfermaria - menti. eu não tinha outra saída, falar do Ricardo desse jeito seria um tanto quanto estranho.
- Mentira! Eu mesma fui ver na enfermaria e todos disseram que não viram você. E saiba que eu reparei que depois do intervalo você e aquele seu amigo novo sumiram. 
- Ei, o Ricardo não voltou para aula? Não, ele simplesmente desapareceu!
- De novo! - falei em voz baixa para mim mesma.
- O que disse?
- Hã... nada. Nada não Lux.
- Sua louca - e me tacou a almofada - Vamos falar sobre o trabalho e esse seu amiguinho misterioso? Hen hen?
Dei umas três risadinhas nervosas consecutivas.
- Ok sua chata! Já pesquisou sobre aqueles caras carecas e de barba branca que filosofavam? 
- Já sim. Mas ficou alguns faltando. Dá pra você pesquizar Aristóteles e Platão? 
- Claro. Isso eu faço em dez minutos!
- Olha só que convencida. 
E então estavamos rindo de novo. Peguei no freezer mais uma vez o enorme pote de sorvete e tirei três bolas do meu sorvete preferido: Flocos! Para cada uma de nós. Comemos e rimos mais um pouco das piadas da Lux sobre o meu amigo que sumia depois do intervalo.
- Ah Lice, me conta vai... Você ficou com ele não ficou? 
- Eu... Ei Lux, deixa isso onde deve estar, longe daqui!
- Ih, se não ficou, brigou! Conta amiga!
- Não Lu, no momento certo você vai saber.
- Vou fazer um comentário mas eu espero que você não me bata ok?
- Ta bom.
- Ele é MUITO bonito!
Taquei a almofada mais perto de mim bem no meio do rosto dela
- Ei! Você disse que não bateria! 
- Você disse que esperava que eu não fizesse e eu não prometi nada!
- Mas que ele é bonito ele é! Parece um anjo! 
- Fica quieta ai Lux! - então dei um tapa amigável no seu ombro recolhendo as taças, agora vazias, de sorvete indo até a cozinha deixando-as em cima da pia.

A tarde começava a cair entre as montanhas e eu precisava arrumar o jantar para mim e para minha mãe. Lux recolheu seu pesado casaco de frio e foi embora cruzando somente a rua para chegar em sua casa. Liguei a tv no canal de música e coloquei na opção de Blues. Quase ninguém sabia que eu gostava disso e eu ouvia simplesmente para poder relaxar. Acendi o fogo no fogão branco mármore e a água que fervia; fervia como as veias que pulsavam o meu coração.

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