sábado, 24 de abril de 2010

CAPÍTULO III - França



  

Senti meus olhos arderem. Um princípio de choro talvez, ou apenas uma aversão profunda ao nome dele. Ligar? Não ligar? Eu estava em um dos piores dilemas da semana depois do melhor dia da mesma. Frustrante, frustrante. Lembrei de tudo o que ele me fez passar alguns dias atrás. Ter a audácia de me mandar um buquê de flores com um cartão de término dentro! Foi como ganhar rosas, porém sem rosas, só os espinhos. Ter que encarar a dura e fria verdade me deixava com medo e ansiosa ao mesmo tempo. E se agora ele quisesse voltar? Se ele se arrependeu? Eu só queria que os questionamentos parassem, por no mínimo dez minutos. Eu precisava pensar, precisava determinar um ponto de partida a partir dali.
Meu celular estava no bolso e agora parecia pesar mil quilos. Peguei-o e olhei para a tela agora coberta por uma pintura abstrata que havia achado na internet dias atrás para por no lugar na minha foto com Fernando. Me lembrei de quando estava junto com ele, de quando o conheci, do nosso primeiro abraço, primeiro beijo. Era bom e ruim, porém os motivos eu não sabia explicar. Coloquei na parte de contatos, como hábito e lá estava na letra 'F' o nome e o telefone dele. Eu queria saber o que ele queria dizer, mas não queria ligar para ter que ouvir sua voz. 
'Send'... E o telefone começou a chamar.


- "Alô" - eu respirei fundo.
- Fernando? Oi, sou eu, Alice.
- Alice?! Nossa... Eu... é... eu não esperava que você ligasse de volta.
- Nem eu. O que queria dizer? - Fechei os olhos tentando manter o controle.
- Bom, eu... eu queria dizer que... que...
- Gaguejar agora não vai ajudar muito.
- Tudo bem, eu liguei porque queria te contar algo.
- Vá em frente, estou ouvindo.
- Eu vou me mudar.
- Ah, vai? Para onde? - encarei a janela como se fosse o rosto dele
- Vou para a França. 


Gelei, senti todos os meus membros ficarem dormentes, o mundo ao meu redor começou a girar mesmo eu estando parada. Não, ELE não. Por mais que ele tenha feito tudo o que fez eu ainda o amo. Meu olho se marejou em lágrinhas grossas e pesadas. Fiquei incapaz demais de mantê-las dentro do lacrimal. Respirei o mais fundo que pude.


- França? Nossa, isso é... legal. Não é?
- Não. Eu vou para estudar e não queria ir sem resolver as coisas aqui.
- Coisas? - eu já sabia a resposta, mas eu queria ouvir-lo dizer
- Não quero ir sem resolver as coisas entre eu e você.
- Pensei que já estivesse tudo resolvido, pensei que você já estivesse certo do que queria.
- Eu estou. Bom, pelo menos meu lado racional está, já o meu coração, pensa de forma diferente.
- Sobre isso eu não posso dizer nem aconselhar a nada.
- Eu sei que não, por isso estou assim. Tenho que desligar, vou terminar de fazer as malas.
- Mas você já vai viajar?
- Sim, amanhã a tarde. Posso passar ai e... me despedir?
- Hã... pode sim.
- Ta bom. Tchau. Ei! 
- Oi, pode falar.
- Eu te amo!
*tu...tu...tu...*


E então ele desligou. Com apenas um 'Eu te amo' ele desligou e agora ele também vai embora. Com um continente de distância de nós. Isso é tão injusto. Pela forma como ele falou, pelo jeito como foi nossa conversa, nós iríamos nos acertas, eu estou pronta a perdoar. Droga! Eu ainda o amo.
Me deitei na cama, meu rosto ainda molhado das lágrimas que derramei e derramava ainda. A voz de Fernando passava por minha cabeça como se fosse um gravador programado a repetir a mesma faixa diversas e diversas vezes. 'Eu te amo', 'Eu te amo'... E então, eu me lembrei, lembrei daquilo que tinha me feito feliz naquela mesma tarde. Me lembrei de Ricardo. Ricardo e seu sorriso encantador, seu all star surrado e lindo, seus cabelos sobre o vento. O mesmo que me fez rir por causa de um cachorro-quente, o mesmo que tinha me pedido para voltar ao parque no dia seguinte. Mas como eu iria voltar? Fernando ia vir aqui, se despedir de mim, e quando eu o visse, eu não sabia o que seria de mim. Talvez eu o abraçaria, ou somente o beijaria no rosto de longe, ou até mesmo nem chegasse perto. Eu tinha tantas escolhas para fazer, tanta coisa para poder colocar no lugar. E uma delas era a minha própria cabeça. Minha mente, meus pensamentos, meu centro de tudo.
Levantei e coloquei a mão nos bolsos como de costume. Então foi quando tirei e abri aquele minúsculo papel. Escrevia-se


Avenida Sherman Nunes - Nº 13
Sei que vai precisar de mim. Quando isso acontecer eu vou estar aqui.
Beijos, Ricardo.

Parei por cinco minutos olhando aquele endereço-recado escritos naquela folha. Ele devia ter posto o papel no meu bolso enquanto eu dei o beijo no rosto dele e depois ter pego a minha mão só para me distrair. 
Então foi por isso que ele disse que ainda tínhamos muito para conversar? Era impossível ele saber sobre o Fernando, muito menos saber do recado que ele havia deixado com minha mãe depois que me ligou a primeira vez.
Sem pensar peguei meu casaco velho que estava jogado em cima da cadeira, desci as escadas e disse a minha mãe que iria resolver algo na casa de uma amiga. Sai, caminhando na rua molhada pela chuva quase correndo. A Avenida Sherman Nunes não ficava muito longe da minha casa, eu passava lá uma vez por semana a dois anos atrás quando ainda estudava em uma escola secular do bairro. Eu chegaria lá em menos de quinze minutos.
Passando por vários comércios e até mesmo um bar com um monte de caras assistindo um jogo de algum esporte no qual eu não sabia descrever. Entrei na pequena avenida iluminada pelos grandes postes coloniais e procurei pelo número 13. Do lado direito encontrava-se os números pares e a esquerda os ímpares. Não caminhei muito até encontrar uma casinha de tijolinhos vermelhos iluminada por uma luz branca e muito forte que devia ser da sala de estar. A campainha de ferro preto estava ao lado do portão, olhei duas vezes até ter certeza do que queria e então toquei.
Um minuto depois apareceu ele, Ricardo, com uma blusa-azul-pijama um short peculiar e chinelos com meias. Se fosse outra pessoa para mim pareceria brega, mas nele era absurdamente lindo.


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Soundtrack CAP II
Tomorrow - Avril Lavigne
Lost Without You - Robin Thicke
Hallelujah - Paramore
My Heart - Paramore


Be yourself
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